Quase toda semana, me deparo com variações da mesma pergunta:
Como eu escrevo um bom livro?
A pergunta é tão ampla que eu costumo pedir para que seja desmembrada na dor mais imediata que aflige o escritor.
Hoje, faço o contrário. Serei generalista, ignorando conscientemente que cada um constrói o seu próprio caminho único ao escrever um bom livro. Tudo isso com a intenção de dar um norte para os mais desesperados.
Ressalto que este post, assim como todos os outros do GUIA, precisa ser interpretado e analisado com cuidado. Ignore o que não faz sentido para você. Quer dizer, só não ignore nenhuma dessas cinco regras. O resto, fica por sua conta.
Então, o que você precisa fazer para escrever um bom livro:
Leitura
Antes de mais nada, leia. Leia muito. Leia de tudo. Leia sempre.
Existe uma sequência natural em todas as carreiras. Primeiro um advogado precisa conhecer as leis, para interpretá-las e achar as suas brechas. Antes de saber construir uma casa, um engenheiro precisa ter familiaridade com materiais de construção até que possa decidir qual deles usar.
Da mesma forma, um escritor precisa ser um leitor apaixonado e voraz para, então, poder moldar as palavras à sua vontade. Por isso, se você leu poucos livros e quer escrever um romance, o resultado irá te frustrar.
Proponho que dê um passo para trás e leia bastante. Só continue depois de ter lido, pelo menos, 100 livros.
E se você não gosta de ler e, mesmo assim, quer ser um escritor?
Sem problema. Você só não vai escrever um bom livro.
Técnicas
Antes de Picasso desenvolver a sua forma singular de pintar, ele estudou a técnica de seus antecessores e produziu quadros belíssimos nos mais variados estilos.
A lição é: sem estudo, você não tem técnica. E sem técnica, não há qualidade nem originalidade.
Lógico que você pode escrever um bom livro sem estudar diretamente a técnica. Você provavelmente conhece exemplos de ótimos escritores que não sabem usar nem um storyline, nem uma escaleta. Mas nunca ouvi falar de nenhum desses que não estudou indiretamente (e exaustivamente) as técnicas através da leitura e da escrita de bons livros. Sim, escrever também é estudar a escrita.
Estilo
Com o barateamento da produção de filmes, novelas e séries, o enredo ganhou muita importância em detrimento dos diálogos e atuações. Nos livros, a consequência é a falta de cuidado com o estilo. Na ânsia de colocar a história no mundo, muitos não pensam nas palavras.
Um erro crasso. A palavra é o tijolo da narrativa. Uma palavra no lugar errado faz uma parede cair. Pior. A queda repentina arranca o leitor da história e pode estragar a sua experiência.
Por isso, tenha em mente que é através do estilo que o enredo é transmitido.
Sem o estilo adequado, o livro é necessariamente ruim.
Empatia
As histórias tocam corações através de emoções universais que são reconhecidas pelo leitor. Então, antes de escrever é preciso conhecer essas emoções – o que se consegue vivendo e sofrendo.
Mas eu não recomento que sai por aí à procura de sofrimento desnecessário. Ao invés disso, abra o seu coração para a dor do outro. Sinta a solidão de um morador de rua. Entenda o que motivou os soldados dos dois lados de uma guerra. Olhe para o coração do terrorista até ir além da frustração e da fé. Não pare até enxergar o altruísmo mal direcionado de quem se sacrificou achando que fazia o bem-maior. Desarme-se dos pré-julgamentos e entenda que ninguém é o vilão em sua própria história.
Nas palavras de Jung:
“Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.”
Esqueça tudo o que aprendeu
Depois (e apenas depois) de ter lido muito, estudado até dominar a criação de enredos e arte de moldar os estilos, até ter aberto o seu coração para o mundo (e sofrido com ele), só então, esqueça tudo o que foi aprendido e procure o seu próprio caminho na literatura.
É só nesse momento que você estará pronto para ser original e único. Então, concentre-se no seu livro. Viva ele. Converse com as personagens. Chore e ria com elas. Seja amoroso ao usar cada uma das suas palavras. Exerça sua empatia e sensibilidade.
Não é um caminho fácil. Nem rápido. Mas, se você fizer tudo isso, eu te prometo que você escreverá um bom livro.
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