Todo escritor já ficou bloqueado em algum momento. Já viu seu ritmo de escrita minguando até que a insegurança bater. Então, acontece o efeito cascata: as incertezas sobre as suas próprias capacidades diminuem ainda mais o ritmo da escrita. O que cria mais inseguranças. Esse ciclo infeliz acaba em uma página em branco sendo encarada por olhos desesperados.
Todo escritor passou e vai passar por isso. Aconteceu com aquele seu autor favorito. Aconteceu comigo. E aconteceu e acontecerá com você e com todos nós. Faz parte.
Não foram poucos os dias que passei de olhos cravados em páginas pouco e mal escritas. Foram tantos que não consigo estimá-los. Mas, de uns tempos para cá, esses dias desperdiçados são cada vez mais raros.
Muita coisa mudou. Passei a dedicar mais tempo à escrita. Comecei a ter feedbacks positivos. E a própria repetição de erros trouxe uma previsibilidade tranquilizadora. Mas a razão fundamental foi que eu finalmente compreendi e internalizei as palavras do escritor americano Ernest Hemingway:
a primeira versão de qualquer coisa é uma merda.
Parece pouco, mas se você aceita que a primeira versão do seu livro não será boa, você para de esperar que ela seja ótima. Entenda que o nosso trabalho de escritor se assemelha muito ao trabalho de um escultor. Vamos trabalhando o mármore aos poucos, acreditando que algum dia a pedra vai se transformar em arte e que, em alguma ocasião futura, você terá orgulho do que fez.
O bloqueio criativo acontece quando a nossa autoconfiança está abatida. Olhamos para o texto e supomos que ele nunca será bom porque não está bom naquele momento. E nesse suposto fracasso prematuro da nossa obra, enxergamos o nosso fracasso pessoal. Essa fusão de duas esferas da vida – pessoal e profissional – cria conflitos existenciais e, quando as incertezas tomam o controle da nossa mente, escrever se torna quase impossível.
Então, eu proponho que, antes de mais nada, você pondere mais uma vez sobre as palavras de Hemingway. “A primeira versão de qualquer coisa é uma merda”. Elas pressupõem que nada é criado do dia para a noite. Que o esforço de reconstrução é inerente ao processo de criação.
E que o trabalho do escritor é tanto escrever quanto reescrever.
Mas, aproveite! Essa frase também carrega um grande viés libertador. Se a primeira versão necessariamente será ruim, não deve existir pressão para que ela seja boa.
E, na via das dúvidas, sempre que você ficar encarando uma página por muito tempo, faça quatro coisas:
Dê uma pausa na escrita, saia de casa e caminhe/corra. Arejar a cabeça ajuda a pensar em novas soluções.
Se comprometa a, assim que voltar da caminhada, se dedicar à escrita por pelo menos mais uma hora. Escrever exige disciplina e disciplina exige superação.
Não pense nas suas qualidades e defeitos como escritor, muito menos nas qualidades e defeitos do seu texto. Fuja do drama "eu não sei fazer nada direito". Apenas escreva o máximo que conseguir. Foque na quantidade, agora. O momento da qualidade chegará depois.
Se nada disso funcionar, faça uma lista das coisas que você não quer escrever. Saber o que não pertence a sua história te ajuda a entender o que pertence.
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